Cervejarias e profissionais do mercado cervejeiro se revoltam com a estratégia adotada pela defesa da Backer em apontar contaminação em toda e qualquer cerveja.
Declaração da Backer de que toda cerveja tem traços de dietilenoglicol é repudiada por todo o mercado cervejeiro nacional. De pequenas a gigantes cervejarias, todas afirmam ser caluniosa e sem o menor fundamento técnico a acusação da cervejaria.
Em audiência pública na Câmara Municipal de Belo Horizonte, nessa quarta-feira, representantes da Backer afirmaram que o mono e o dietilenoglicol são formados durante o processo de fermentação, portanto as substâncias estariam presentes em toda e qualquer cerveja .
Além disso, segundo a Backer, a empresa fez por conta própria análises em cervejas do mercado e encontrou a presença dos etilenos. Análise cujos laudos a empresa não apresentou e que contraria aquela feita pelo Ministério da Agricultura e Pecuária.
Abracerva repudia declaração da Backer
Com surpresa e indignação, o presidente da Abracerva – Associação Brasileira de Cerveja Artesanal, Carlo Lapolli recebeu a notícia da audiência pública. Para o site Pão e Cerveja, Lapolli afirmou que repudia a declaração da Backer – ” realmente a gente repudia, não faz muito sentido técnico. Estou chocado com a postura deles, infelizmente é a postura de quem não assume os próprios erros. O mercado não é isso, a falha foi da Backer e ela tem que arcar com as consequências.”
“Agora não adianta querer imputar qualquer tipo de suspeitas em cima de outras cervejarias. Entendo o motivo de desespero deles, mas repudio totalmente essa ilação sem nenhum fundamento técnico. É uma estratégia, talvez, jurídica mal orientada para querer jogar lama nas outras cervejarias”, completa Lapolli
Cervejarias apontam deslealdade e mentira na declaração da Backer
Bruno Parreiras, um dos sócios da Cervejaria Küd, também diretor do Sindibebidas MG, disse sentir tristeza e frustração diante da deslealdade com o mercado cometida pela Backer.
“A gente aqui da Cervejaria Küd sempre se preocupou em oferecer produtos diferenciados, consistentes com nossa proposta de valores e sempre ajudou a construir colaborativamente o setor de cervejas e a cena cervejeira em todos os níveis. Assim como já falamos em outras ocasiões após este incidente, não usamos nenhum destes elementos (mono ou DEG) em nossos processos. ” declara Bruno Parreiras.
” sabendo da dificuldade de empreender no Brasil, recebemos essa declaração com repúdio, tristeza por vir de pessoas que eram tidas como referência no segmento e com frustração por perceber que em nada essas palavras colaboram para o setor, cujo cenário é cada vez mais difícil, com alguns players desleais colocando uns em desvantagens legais em relação a outros.” lamenta o sócio da Küd
A falta de fundamentação técnica da declaração de que há formação de etilenoglicol no processo fermentativo é apontada também pelo mestre-cervejeiro e biólogo, Carlos Henrique Vasconcelos, da Cervejaria Hofbräuhaus em Belo Horizonte. Para ele, uma acusação desse teor precisa vir acompanhada de comprovação científica, o que não houve.
“O monoetilenoglicol e o dietilenoglicol não fazem parte dos produtos metabólicos das leveduras cervejeiras. Não há estudos que apontem para a produção dessas substâncias durante o processo fermentativo. Afirmar que há a possibilidade de síntese pela levedura de monoetilinoglicol e dietilenoglicol, mesmo que em quantidades traço, demandaria a apresentação de fontes que validassem o fato, mas tais fontes não existem até então.” afirma Carlos Henrique
Diretor da Cervejaria Wals, Leandro Mendonça também se pronunciou sobre o assunto: “Assim como diversas outras cervejarias artesanais, a Cervejaria Wäls não utiliza as substâncias mono ou dietilenoglicol e, portanto, seus produtos não contêm qualquer traço dessas substâncias. É um momento extremamente delicado para todos os envolvidos no caso da Cervejaria Backer e devemos aguardar o assunto ser devidamente esclarecido pelas autoridades.”
Ação criminal por calúnia
Presidente do Sindibebidas-MG e diretor da Abracerva, mestre-cervejeiro Marco Falcone fala até em processo criminal contra a Backer por calúnia. Ele, que em todas as muitas entrevistas dadas desde o início desse caso defendeu a boa fé da cervejaria, se diz indignado – ” não podemos aceitar uma mentira dessas! Querem levar o mercado inteiro para a vala que eles cavaram por um erro próprio”, se revolta Falcone.
Homebrewers também se revoltam
A falta de fundamento técnico e falta de ética da declaração da Backer também indignaram os cervejeiros caseiros de Belo Horizonte. Ex- associado da Acerva Mineira, ganhador do concurso Mestre Cervejeiro Eisenbahn em 2019, Cláudio Botelho enxerga desespero da cervejaria
” É no mínimo lamentável, para se usar um adjetivo elegante, ver a Backer, no auge do seu desespero, apontar a fermentação cervejeira como a causa geradora do dietilenoglicol que intoxicou seus clientes. Não só falta com a ética, como também ignora séculos de pesquisas sérias, como a de Louis Pasteur e da família Carlsberg, e tenta afundar com ela todo o setor cervejeiro brasileiro” , pontua Botelho.
Profissionais de outros estados se posicionam
Com nítida decepção em relação à postura da Backer, o Sommelier de Cervejas, cervejeiro e professor Ronaldo Rossi, de São Paulo, lamenta os danos ao trabalho de anos para a consolidação do mercado das artesanais: “nós trabalhamos esse tempo todo muito duro pela formação de um mercado cervejeiro, para, de repente, um caso isolado poder destruir o que a gente vem tentando construir com tanta dificuldade esse tempo todo.”
Nota do editor – desculpas devidas
Eu, Fabiana Arreguy, mais do que ninguém, sinto uma profunda decepção diante da postura adotada pela Backer na audiência pública da Câmara Municipal de Belo Horizonte.
Desde os primeiros áudios propagados pelo Whatsapp, apontando a cerveja Belorizontina como causa de contaminação, saí em defesa da cervejaria, que declarou ser vítima de um boato maldoso.
Fui acusada de ser comprada pela Backer e ganhar para defendê-la, o que não corresponde à verdade. Infelizmente fui crédula e confiei na inocência da empresa. Acreditei na ética e no profissionalismo deles.
Preferi me manter calada após o primeiro laudo policial que constatava a contaminação da cerveja, dando mais um voto de confiança à cervejaria e aguardando o esclarecimento de um caso tão improvável e obscuro como esse.
Mas, diante da declaração infundada dos representantes da Backer, tentando levar com ela todo o mercado cervejeiro ao qual me dedico por mais de uma década, só me resta pedir desculpas públicas e me retratar pela defesa que fiz.
Não tenho como me justificar, apenas digo que errei feio em acreditar na inocência da empresa, errei feio em empenhar minha palavra a favor dela, errei feio em expor meus leitores e ouvintes ao erro. Me retrato aqui, no mesmo canal utilizado para defender o que não tinha defesa.
Faço coro ao mercado cervejeiro nacional e repudio as declarações irresponsáveis e antiéticas da Backer.
Que seja feita justiça e que os culpados por duas mortes e pela contaminação de dezenas de pessoas paguem pelo seu erro.
Conteúdo rastreado pelo Radar Bebendo com Amigos. Originalmente postado por /Pão e Cerveja UAI
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