O inquérito da Polícia Civil de Minas Gerais sobre as intoxicações por contaminação por dietilenoglicol de rótulos da cervejaria Backer ainda não chegou ao fim, mas a hipótese de sabotagem está descartada. Assim, a investigação liderada pelo delegado Flávio Grossi está centrada na avaliação de outras possibilidades, especialmente a de negligência na fabricação.
“Neste momento, a linha de sabotagem foi descartada; a investigação não evoluiu para esse sentido. A negligência é umas das linhas que estão sendo analisadas”, declarou Grossi, em entrevista coletiva.
De acordo com as informações da Polícia Civil, são 42 vítimas, sendo nove fatais. Dessas, em cinco foram realizados exames de necropsia, com quatro confirmando a contaminação – a avaliação nos testes do quinto ainda está em andamento, como detalhou o delegado. Ele também apontou que nos outros casos fatais, as perícias são indiretas e ainda não há uma conclusão.
“Das nove vítimas fatais, cinco exames de necropsia direta foram realizados, sendo que quatro deles foram positivos para contaminação e um está em andamento. As quatro perícias restantes serão realizadas de forma indireta. Inicialmente, pedimos a exumação do corpo, mas posteriormente optamos por realizar através de exames e documentos médicos para a elaboração do laudo médico-legal”, disse.
As investigações se iniciaram em janeiro e colheram, até agora, 66 depoimentos. Mesmo com os mais de três meses de apuração, Grossi assegurou que a pandemia de coronavírus não atrasou a busca por respostas. E apontou a complexidade do caso como principal fator para o inquérito ainda não estar concluído. Ainda assim, garantiu que uma conclusão deve ser apresentada em breve.
“As perícias estão em andamento e em reta final, e não pararam em nenhum momento. Elas estão em estágio avançado e próximas de serem concluídas. É uma investigação complexa, que abrange diversas frentes, perícias de engenharia, perícias médicas, investigações sociais. Todos os agentes estão se dedicando para dar uma resposta rápida para a sociedade”, afirmou.
Porém, a pandemia do coronavírus alterou o modo de realização da perícia envolvendo as vítimas não fatais da contaminação. Também foram feitas visitas para investigação na fábrica da Backer com o objetivo de entender como se deu a contaminação das bebidas. Nesse caso, os trabalhos estão sendo realizados com a cooperação técnica do Centro de Desenvolvimento de Tecnologia Nuclear (CDTN), órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCTIC). Ao mesmo tempo, ocorreu a análise dos tanques onde eram produzidas as cervejas.
“Até o início da pandemia, eles ocorriam normalmente de forma direta, mas foram interrompidos em respeito às vítimas e considerando as recomendações médicas e sanitárias, sendo substituídos por exames indiretos por apresentação de prontuários, que estão em andamento. Eles serão analisados pelos médicos legistas, que irão concluir um laudo pericial”, ressaltou.
Backer diz agir de boa fé
Diante do cenário exposto pela Polícia Civil, a Backer optou por se pronunciar através de uma carta aberta. No documento, garante estar colaborando com as investigações e assegura sempre ter prezado pela segurança na produção dos seus produtos, enumerando ações adotadas, como o recolhimento de garrafas e rótulos suspeitos de contaminação. “Reconhecemos que aconteceu algo lamentável e asseguramos que vamos honrar nossa responsabilidade”, admite.
Fazendo uma série de questionamentos em sua nota, a Backer indaga sobre como o dietilenoglicol pôde aparecer nas suas cervejas se não fazia parte da fórmula para produção dos rótulos. E, do mesmo modo, diz aguardar o fim das investigações, com os resultados da perícias, além da apresentação de laudos e provas.
“O inquérito policial ainda não foi concluído. Como um agente que jamais fez parte da produção foi parar lá? Por que ele foi misturado à cerveja? Faltam resultados de perícias, provas técnicas,
confirmações sobre laudos e muitas outras respostas.A Backer aguarda o fim da investigação”, afirma.
Outro ponto delicado do caso, a negociação com as vítimas e suas famílias, também foi abordada pela companhia. A empresa garante manter conversas constantes e já ter fechado acordos indenizatórios, ainda que sem apresentar qualquer detalhe. Na última quinta-feira, a empresa pediu à Justiça a realização de uma audiência de conciliação com o Ministério Público de Minas Gerais e as famílias das vítimas de intoxicação pelo dietilenoglicol.
“Desde o aparecimento do primeiro caso suspeito, atendemos 107 pessoas com dúvidas e solicitações em nossos canais de acolhimento”, diz. “A Backer se reuniu com famílias que solicitaram ajuda,
concluiu acordos e efetuou pagamentos”, acrescenta.
A empresa também criticou a ordem judicial que determinou o bloqueio de R$ 50 milhões dos seus bens para garantir o ressarcimento das vítimas. “Os valores dos bloqueios de bens solicitados contra a Backer são incompatíveis com a escala do negócio”, contesta. “Somos uma empresa familiar. Nossas receitas são artesanais. Não somos multinacional nem lideramos o mercado. Nosso maior resultado até hoje foi um lucro anual de R$ 980 mil, em 2018”, afirma.
Da mesma forma, a Backer lembra que sua fábrica continua fechada, o que a teria levado a demitir 50 funcionários. “O prazo para retirada dos lacres pelas autoridades públicas já expirou. Cinquenta funcionários foram demitidos. Outros 150 aguardam em casa o chamado para voltar a trabalhar”, comenta.
E conclui o seu documento com um apelo. “Pedimos um voto de confiança. A Backer tem boa-fé”.
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